segunda-feira, 28 de março de 2011

O Que é Positivismo

Resumo: QUE É POSITIVISMO, João Ribeiro – Coleção Primeiros Passos, Brasiliense, 1982

OS FUNDAMENTOS DO POSITIVISMO

            “Augusto Comte usa o termo filosofia na acepção que lhe davam os antigos filósofos, particularmente Aristóteles, como definição do sistema geral do conhecimento humano; e o termo positiva designa, segundo ele, o real frente ao quimérico, o útil frente ao inútil,a segurança frente a insegurança, o preciso frente ao vago, o relativo frente ao absoluto.
                Seu método de trabalho é o histórico genérico indutivo, ou seja, observação dos fatos, adivinhando-lhes por indução às leis da coexistência e da sucessão, e deduzindo dessas leis, por via da conseqüência e correlação, fatos novos que escaparam da observação direta, mas que a experiência verificou.
(...)
                Para fundamentar sua corrente filosófica antimetafísica, Augusto Comte, embasado nesse método, parte da premissa de que é no estado positivo que o espírito humano reconhece a impossibilidade de obter noções absolutas. Assim renuncia a indagar a origem e o destino do universo e a conhecer as causas íntimas dos fenômenos, para se consagra unicamente a descobrir, pelo uso combinado do raciocínio e da observação, as suas leis efetivas, isto é, as suas relações invariáveis de sucessão e de semelhança.
(...)
                No desenvolvimento do espírito humano, Comte admite uma lei fundamental que recebe o nome de lei dos três estados, ou modo de pensar, que é a base de sua explicação da história: o estado teológico-fictício, que tem diferentes fases (fetichismo, politeísmo e monoteísmo) e em que o espírito humano explica os fenômenos por meio de vontades transcendentes ou agentes sobrenaturais; o estado metafísico-abstrato, onde os fenômenos são explicados por meio de forças ou entidades ocultas e abstratas, como o princípio vital etc.; e o estado positivo-científico, no qual se explicam os fenômenos, subordinando-os às leis experimentalmente demonstradas.
                Todas as ciências, segundo Comte, passaram pelos dois primeiros estados, e só se constituíram quando chegaram ao terceiro. O Estado Positivo é, pois, o termo fixo e definitivo em que o espírito humano descansa e encontra a ciência. As sociedades evoluem segundo essa lei, e os indivíduos, em outro plano, também realizam a mesma evolução.
                Partindo do princípio de que o objeto da ciência é só o positivo, isto é, o que pode estar sujeito ao método da observação e da experimentação, Augusto Comte só reconhece as ciências experimentais ou positivas, que tratam dos fatos e das suas leis. Distingue, assim, as ciências abstratas das concretas.
                As ciências abstratas, que são fundamentais, formam seis grupos e, dispostas na sua ordem hierárquica, são as seguintes: matemática, astronomia, física, química, biologia e sociologia. As concretas, como a mineralogia, a botânica, a zoologia, segundo Comte, não estão ainda constituídas e, por isso, ele não as classifica.
(...)
                Na parte especial, a doutrina positivista pode ser considerada sob quatro aspectos. (...), os aspectos sociológico e religioso, que partem desde a divisão dos poderes sociais em material, intelectual e moral, exercidos por uma elite, isto é, os dirigentes. (O Positivismo não aceita as classes com o significado geralmente empregado na atualidade. Aceita sim, que em toda a sociedade, desde a mais primitiva, há dirigentes e dirigidos. Os dirigentes devem sempre ser os mais capazes, isto é, aqueles que influem na educação e na cultura da espécie humana: são os sacerdotes, os filósofos, os cientistas, os jornalistas, os professores etc., ou melhor, os teóricos que modificam o pensamento dos indivíduos através de sua pregação e de sua conduta moral.) Embasado na concepção biológica da sociologia, Augusto Comte entende a sociedade como um organismo cujas partes constitutivas são heterogêneas, mas solidárias, pois se orientam para a conservação do conjunto. Assim, à semelhança do organismo, encontra-se nela uma divisão das funções especiais, onde se nota a presença da espontaneidade, da necessidade, da imanência e da subordinação de todas as suas partes a um poder central e superior.
Segundo Comte, a sociedade possui um ritmo evolutivo incompatível com a revolução violenta. Deste modo, concebe-a sempre em termos harmônicos. Para ele, a sociedade reflete os diversos estados da vida de um homem; dessa forma, uma vez que os organismos não podem mudar bruscamente, senão através de uma evolução paulatina, também a sociedade está sujeita a esta norma de evolução.
Partindo da idéia de que a natureza humana evolui segundo as leis históricas, embora em si mesma não ocorra nenhuma transformação, isto é, existe uma base perene no homem frente ao elemento cambiante da sociedade, Comte divide o estudo da estrutura social em dois campos principais: o estudo da ordem social, que ele denomina de estática social, e o estudo da evolução da sociedade, que recebe o nome de dinâmica social. Enquanto a estática estuda o consenso (solidariedade) ou o organismo social em suas relações com as condições de existência, traçando a teoria da ordem, a dinâmica parte do conjunto para as particularidades, e determina o progresso geral da humanidade.
Comte olha para o progresso social como condicionado pelos concomitantes biológicos dos indivíduos, de tal forma que nenhuma estrutura social é possível sem que esteja previamente determinada nos fatores biológicos, aliás irredutíveis como o são todas as categorias de fenômenos na concepção comtiana.
(...)
                O progresso da sociedade é caracterizado, assim, pela incessante especialização das funções, como todo o desenvolvimento orgânico, para maior aperfeiçoamento na evolução dos órgãos particulares.
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                Desta forma, excluindo toda intervenção apriorística de noções abstratas e idéias universais, que caracterizavam as ciências sociais da época, o positivismo, "como regime definitivo da razão humana frente à ação dissolvente da metafísica" surgiu do progressismo, baseado no desenvolvimento científico que dominou todo o século XIX, como o objetivo de aproveitar as virtudes do progresso, ou da evolução progressiva, pela compreensão racional e científica do problema da ordem, determinando os elementos fundamentais de toda a sociedade humana.
(...)
                É nesta linha de raciocínio que Augusto Comte, partindo da noção de solidariedade que, em sua opinião, impera na sociedade, apresenta uma política de paz e amor, substituindo a idéia sobrenatural do Direito pela idéia natural do Dever. A política positiva não reconhece nenhum direito além do de cumprir o dever, e, assim, nega categoricamente a própria existência do direito como tal.
(...)
                Para Comte, sociologia é a ciência abstrata que estuda os fenômenos dos agrupamentos sociais. A ciência política é a aplicação prática da sociologia, estudando casos particulares, tendo porém sempre em mira o ponto de vista moral. A política é a arte de bem aplicar os conhecimentos abstratos da sociologia (saber para prever, a fim de prover). Seja como for, ciência política, para Comte, é a que diz respeito à história do Estado e/ou à teoria e prática de sua organização.
                Segundo Comte, a noção de direito deveria desaparecer do domínio político, como a noção de causa do domínio filosófico, porque ambas se referem a vontades indiscutíveis. Ele entende que o positivismo não admite senão deveres de todos para com todos; pois que seu ponto de vista, sempre social, não pode comportar nenhuma noção de direito, constantemente fundada na individualidade. (...)
                O homem como individualidade não existe portanto, na sociedade científica, senão como membro de outros grupos, desde o familiar - unidade básica por excelência - até o político.
                Também aí não há lugar para a liberdade de consciência. A consciência, para Comte, não determina sozinha o modo de existência prática, como não bastam as condições materiais da vida para definir a consciência.
                E a própria soberania popular é um termo vazio de sentido em sua política positiva, onde a ditadura se exercita num despotismo espiritual e temporal, pois adota o princípio da força como fundamento do governo.
(...)

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